quinta-feira, 19 de novembro de 2009

XXII-Novamente as Palavras

Por vezes não sai nada. Uma solidão imensa embrenha-se no meu interior e seca-me. As palavras ficam murchas e vão secando e começando a cair pelas minhas paredes. Batem bruscas de encontro a elas e desfazem-se em silêncios de pó! O meu vento interior, agreste e áspero tenta varrê-las para longe da solidão que me assola. Pego nelas e arrumo-as num cantinho. Fazem um montinho, um pozinho que pouco a pouco se começa a elevar tentando sair do meu deserto interior.
Não quero secar e não posso secar. Tenho de dar vida às palavras. A inquietação começa a tomar conta de mim. As palavras quietas e adormecidas, montinhos quase de lixo e secas, prestes a desfazerem-se começam ganhar vida. Começam a ficar viçosas e a subir pelas minhas paredes. Começo a ficar nervoso, irrequieto e agitado. Mexo-me, remexo-me e torço-me para todos os lados. Pego então nelas e ficamos a sós. Nessa altura tudo deixa de existir, nada mais à minha volta faz sentido. O mundo em nosso redor como que acabou. Não vejo mais nada, nada mais oiço, não tenho sede, nem fome nem sono. Eu e as palavras. Eu a tratar delas a regá-las a alindá-las tentando fazer a mistura certa as proporções certas! Elas acariciando-me fazendo-me cócegas nos dedos, escorregando pelo gargalo da caneta, pela lisura do lápis e colorindo o branco triste da página. Finalmente sinto-me novamente vivo! A secura, a aridez e a solidão que varria o meu interior transformaram-se num riacho fresco e fértil. Nada mais existe, todo o mundo desapareceu. Só eu e elas, só elas e eu. E o silêncio. Em frente o azul do mar e no azul do céu o risco feito pelo grito das gaivotas. Misturo-me com elas, eu e as palavras, e sentamo-nos no risco que desenharam no ar. Balançamos as pernas de um lado para o outro como crianças felizes. Damos as mãos e começamos a rezar.
As gaivotas passam voando e sorriem para nós.